5 boatos sobre o vírus da Zika que não passam de boatos
Embora não haja nenhuma prova absoluta de
que o vírus da Zika esteja por trás da onda de microcefalia no Brasil e
surtos de síndrome de Guillain-Barré em seis países diferentes, as
principais autoridades de saúde do mundo estão quase certas de que esta
relação é verdadeira.
“A cada dia que passa, a evidência de que ele é a causa destes
problemas aumenta”, disse recentemente Thomas R. Frieden, diretor dos
Centros de Controle e Prevenção de Doenças, órgão do governo dos EUA.
Bruce Aylward, que está liderando a resposta da Organização Mundial
da Saúde, afirma: “Neste momento, o vírus é considerado culpado até que
se prove o contrário”.
Mesmo assim, muitos rumores culpando outras causas potenciais
surgiram recentemente, e as autoridades têm trabalhado duro para
desmascarar os boatos. A seguir, você vê quais são as teorias mais
proeminentes que estão surgindo nas redes sociais, juntamente com as
respostas dos cientistas.
5. Os mosquitos geneticamente modificados são a verdadeira causa dos defeitos de nascimento?
Esse som de zumbido que você está ouvindo é um “não”.
A empresa britânica Oxitec lançou mosquitos geneticamente modificados
no Brasil em uma tentativa de controlar a dengue. Mas os surtos de
microcefalia posteriores a isso ocorreram em lugares distantes. Por
exemplo, a maior parte da liberação de mosquitos foi em Piracicaba, que
fica a quase 3 mil quilômetros de Recife, onde a microcefalia é mais
comum. Os mosquitos também foram liberados nas Ilhas Cayman, na Malásia e
no Panamá, sem causar problemas do tipo.
Mosquitos voam menos de dois quilômetros em suas vidas. Além disso,
apenas mosquitos machos foram liberados. Eles não mordem os seres
humanos ou causam a propagação da doença, e foram geneticamente
programados para morrer rapidamente.
4. Poderia um larvicida na água potável estar causando a microcefalia?
Não.
Entomologistas têm taxado como “ridícula” a ideia de que o larvicida
Pyriproxyfen poderia ter causado uma onda tão grande de defeitos de
nascimento. Ele não ataca as células nervosas; o larvicida é um mímico
químico de um hormônio dos insetos que sinaliza às larvas a parar de
crescer, e hormônios de insetos não colocam os seres humanos em perigo.
O Pyriproxyfen foi aprovado nos Estados Unidos em 2001 e é vendido
como um tratamento de pulgas para cães e gatos e como um spray de tapete
para matar pulgas. Os bebês têm passado perto do material por anos sem
dano aparente. E no Brasil e na Polinésia, a lesão cerebral ocorreu às
crianças em muitas comunidades onde o larvicida não foi usado.
3. A culpa é das vacinas?
Não é plausível.
Rumores culparam tanto um “lote ruim de vacina contra a rubéola”
quanto a introdução de uma nova vacina contra a coqueluche no Brasil, ou
o alumínio presente nesta vacina. Também não é plausível.
Não houve surto de rubéola entre as mulheres grávidas e nenhuma
evidência de um “lote ruim”. Nenhuma vacina é usada apenas no nordeste
do Brasil. A nova vacina contra a coqueluche tem sido usada desde a
década de 1990 em muitos países. Ela foi introduzida porque uma versão
mais antiga estava causando dor, febre e, em casos raros, convulsões.
Não microcefalia.
2. E se outra doença está causando microcefalia e síndrome de Guillain-Barré?
Evidências crescentes apontam para o Zika.
O surto de microcefalia começou em cidades brasileiras da região
nordeste, onde os médicos já haviam visto milhares de pessoas com uma
“doença misteriosa”, que mais tarde foi provada ser causada pelo vírus
Zika. Embora não haja nenhum teste rápido para o Zika, os sintomas são
facilmente reconhecidos – erupções cutâneas, olhos vermelhos, febre e
dor nas articulações, em grande número de pacientes que quase nunca
estão perigosamente doentes.
Embora inicialmente tenham diagnosticado de forma equivocada, os
médicos brasileiros sabiam há meses que tinham um grande surto de uma
doença incomum em suas mãos. A mesma coisa aconteceu em Yap Island na
Micronésia em 2007 e na Polinésia Francesa em 2013.
Dentro de algumas semanas após a “doença misteriosa” ter aparecido,
os médicos começaram a notar um aumento na paralisia em adultos –
sintoma da síndrome de Guillain-Barré, uma doença auto-imune que pode
ser desencadeada por infecções virais. Houve uma oscilação semelhante
nos casos na Polinésia Francesa, em 2013, e os casos estão agora
surgindo na Colômbia, El Salvador, Suriname, Venezuela e Martinica –
sempre em sintonia com surtos da Zika. Em alguns casos, o vírus Zika foi
encontrado no sangue ou na urina das vítimas.
Cerca de um ano após o surto ter começado no nordeste do Brasil, os
casos de microcefalia começaram a aparecer entre os recém-nascidos da
região. Patologistas no Brasil, Estados Unidos e Europa têm encontrado
agora o vírus da Zika no tecido cerebral de fetos microcéfalos
natimortos e abortados e no líquido amniótico em torno deles.
1. O Brasil não poderia estar apenas subestimando a microcefalia durante anos?
É possível, mas não por margens suficientemente grandes para explicar o surto atual.
Alguns pesquisadores acreditam que o Brasil já relatou casos de forma
imprecisa, mas não por uma grande margem. Definições de microcefalia
variam, mas os países europeus e norte-americanos relatam
aproximadamente entre um caso a cada 5.000 nascidos vivos e um caso a
cada 10.000. Antes do aparecimento da Zika, o Brasil relatava um caso a
cada 20.000 nascidos vivos – em outras palavras, a metade ou um quarto
de quantos poderiam realmente ter acontecido.
Antes do surto, os sete estados no nordeste do Brasil, onde a
microcefalia apareceu pela primeira vez, relatavam cerca de 40 casos de
microcefalia em um ano. Em outubro, neurologistas de Recife, que
normalmente viam bebês microcéfalos muito raramente, tiveram que lidar
com o tratamento de cinco ou mais de cada vez. Até 17 de novembro,
apenas os sete estados tiveram 400 casos notificados. Um mês depois,
apenas um deles, Pernambuco, informou mais de 600.
Eventualmente, o Ministério da Saúde decidiu que os médicos estavam
fazendo um “sobreregistro” dos casos. Por isso, em dezembro, as
autoridades de saúde do país decidiram mudar sua definição para incluir
apenas as crianças com cabeças com menos de 32 centímetros de
circunferência na definição de microcefalia, em vez de 33, como era
feito até então. Mas os casos continuaram a crescer. Mesmo a
subestimação anterior não explicaria a enorme onda que se seguiu ao
surgimento da Zika.
Espalhando os boatos
Rumores como estes geralmente surgem nos primórdios das epidemias com
frequência. “Os rumores são a alma de qualquer epidemia”, afirma o Dr.
Howard Markel, historiador médico da Universidade de Michigan, nos EUA.
Ele fornece vários exemplos: na Idade Média, a peste foi atribuída a
judeus, que foram acusados de envenenamento de poços. Quando a doença
irrompeu na Chinatown de San Francisco, nos EUA, em 1900, as autoridades
locais culparam as “dietas de arroz”. Um surto de cólera em 1892 em
Nova York foi atribuído a peixes contaminados.
Nos primeiros dias da AIDS, rumores persistiram durante anos dizendo
que a doença não acontecia devido a um vírus, mas que era uma “doença do
estilo de vida gay”, e que o sistema imunológico era comprometido por
uma combinação de promiscuidade sexual e drogas como o nitrato de amilo,
teoricamente usadas pelos homens exaustos pelas noites nas discotecas.
Quando descobriu-se que a AIDS também era difundida na África, os mesmos
“negadores” culparam uma combinação de febres crônicas, perda de peso,
diarreia e tuberculose.
Mas por que os rumores se espalham de forma tão eficaz?
Há três razões.
Primeiro, afirma Markel, porque muitos contêm algumas pitadas de
verdade. Mosquitos geneticamente modificados foram lançados no Brasil e o
larvicida foi realmente usado em algumas cidades.
Em segundo lugar, porque muitos rumores têm um bode expiatório
conveniente. Doenças já foram atribuídas a grupos étnicos. Agora,
corporações são as principais suspeitas. O Pyriproxyfen no Brasil foi
feito pela Sumitomo, uma empresa química japonesa, e rumores sobre ele
enfatizaram a parceria anterior da Sumitomo com a Monsanto, uma empresa
americana vista com desconfiança por muitos ambientalistas.
Em terceiro lugar, porque alguns rumores são espalhados por pessoas
proeminentes. O rumor sobre o larvicida foi iniciado por um grupo que se
autodenomina “médicos das cidades pulverizadas”. Entre os que negavam a
AIDS estavam Peter H. Duesberg, um biólogo molecular premiado, e Thabo
Mbeki, que adotou a opinião do Dr. Duesberg enquanto presidente da
África do Sul. [NY Times]
Fonte: http://hypescience.com/